30 abril, 2010

Sentinelas

Uma das piores coisas na vida militar é o serviço de sentinela em posto ermo, no qual a imaginação corre solta.
Quando aluno na EEAR certo dia fui escalado com o Murilo, meu companheiro de quarto de hora, para o posto da padaria. Hoje em dia lá já não é mais assim, mas naqueles idos de 1972 a padaria ficava atrás do ambulatório e um pouco isolada, com muito mato em frente do posto. Por um lado era bom, porque se ganhava dos padeiros, de manhãzinha, um pão doce quentinho, que era feito para o café da tropa. Por outro lado havia muita estória de assombração que corria sobre aquele posto, no qual gemidos e uivos eram ouvidos, movimentação suspeita no matagal... essas coisas! Por isso o serviço era “tirado” em dupla para amenizar a insegurança de quem estava ali justamente para dar segurança ao quartel. Pois é, sendo o nosso primeiro serviço no local, foi nessa intranquilidade que fomos pra lá. Durante o dia tudo bem, mas quando chegou à noite e o silêncio se abateu no local, começamos a ficar assim... perturbados. Lá pelas duas da madruga, após rendermos a dupla anterior, começamos a ouvir uns barulhos vindos do meio do mato. Uns sons de gente ou coisa avançando pelo capim alto e que vinha na nossa direção. Olhamos um para o outro com os olhos arregaladíssimos e nos preparamos para o pior. O barulho ia gradativamente aumentando e agora dava para ouvir uns bufados como se fosse uma onça se aproximando. Com a garganta seca e a voz tremida demos aquele famoso brado, preconizado nos manuais militares para essas situações:
- AAAlto lá! Que.. quem está aaí?
Nada. E o barulho ia aumentando e nós mais indecisos se enfrentávamos o desconhecido ou corríamos dele! Resolvemos enfrentar. O Murilo não conversou, carregou o mosquetão e falou que o que fosse que aparecesse por lá ia levar chumbo grosso. Eu acompanhei a manobra e me posicionei para o embate com o coração na boca. O negócio estava a poucos metros e se aproximando. Seja o que Deus quiser!
De repente... surge um burro de dentro do mato.
Ufa! Alívio geral!

13 comentários:

Unknown disse...

É muito bom recordar momentos inusitados de nossas vidas. E esse meu marido está muito bem narrado visto que sendo o seu primeiro momento como sentinela muitas imaginações devem ter passado. Dá até para imaginar a cara de vocês frente ao burro e de certo se fosse o inímigo vocês morreriam de susto, muito engraçada a narrativa. Adorei.

Unknown disse...

Amei, já estou esperando a próxima postagem. E por falar em sentinela você está muito lindo nessa foto.
Beijoca.
Ligia

cristiane baracho disse...

Sergi; isso é coisa dos BARACHO.Certa vez papai foi viajar comigo p/ o Espirito Santo(interior serrana).Chegando lá havia um comentário qq a filha da dona dacsa ;já tinha sido picada por um cobra.
No outro dia; papai saí do meu do canavial,gritando com um pedaço de pau em mão,dizendo:Olha a cobra,olha cobra!Corremos pra ver;advinha:Era o rabo de uma vaca no meio do canavial balançando.

Anônimo disse...

Oi amigo,
Belas narrativas, gostei das duas, parabéns.
Raffs.

Daniele Monteiro disse...

Boa Narrativa, cheguei a imaginar uma mulher loira vestida de branco saindo do mato...Que Bom que era só um burrico.

Penha disse...

Esse fato lhe marcou mesmo Baracho.
Nos conhecemos como Tenente ainda em Guará. Lembro me de você contando este "sufoco" nas conversas informais.
Penha

by Sérgio Rolando disse...

Muito bem escrito.... tá parecendo que vai sair um livro de lembranças....
Quanto ao "medo", só quem passou por situação parecida pode saber o que se passa por nossas cabeças...rs...rs...rs...

Rangel disse...

Baracho,

Também passei por um sufoco desses lá pelos idos de 65 quando eu era 1a. série, com apenas 17 anos.
Um dos meus primeiros serviços, sentinela na Garagem da EEAR,de madrugada, sozinho com aquele velho mosquetão enferrujado.
Sem saber o que fazia lá naquela escuridão, contando os infindáveis segundos a espera da rendição.
Muito barulho no matagal, mas pra mim apareceu um cavalo.
Alívio que não era nenhum guerrilheiro contra a revolução salvadora de 64.
Valeu sua nova postagem!
Um forte abraço!
Rangel

Ativaer disse...

Parabéns, Baracho!

Excelente iniciativa.

Fez-me lembrar meu tempo da EEAR,quando de serviço no posto do almoxarifado, vendo as enfermeiras passarem lá na avenida! rsrsrsrs E olha que um dos quais lembro com maior afinco foi justamente naquela quarentena!

Abraços.

Henrique. Cap. R1

RRRAMOS disse...

Quem te viu, quem te vê, hem!
Lá nos fundos daquela última companhia, tinha um monte de ferro-velho, carcaças de aeronaves esparramadas naquela área. Era assombroso o local. Certamente que se fosse hoje, o burro ficaria mais assustado.(rsrsrs....) Brincadeira! Valeu! Um abraço.

Anônimo disse...

Caro Baracho,
Boas Lembraças. As vezes sinto saudades e confesso que passei por situações semelhantes. gostei muito.
Venancio

Projeto SoBalsa.Com disse...

Fato semelhante aconteceu comigo quando em serviço de sentinela no antigo portão da guarda do aeródromo militar de Guaratinguetá. Era madrugada de um fim-de-semana de 1967. Estava na 3ª série e meu inseparável companheiro Moreira, também de serviço, dormia. Ouvi um leve ruido, prolongado, assustador... Ensarilhei a baioneta, protegi as costas e firmei o olhar no negrume da noite fria...nada... Até hoje me pergunto o que se passou alí.
À propósito, o sentinela da foto é a cara do Moreira quando jovem.
Abs.

Joanir dos Santos Costa se disse...

😅😅😅😅 por incrível que pareça, esse negócio de burro tem história! Em junho de 1969, quando chegamos na Escola, os "Cabos Velhos" e outros milicos (Soldados nossos, do Exército, Marinheiros...) fomos brindados com um "convite" muito especial; o Brig Lacerda, então Comandante, "tinha a honra de convidar aos milicos recém-incorporados", a reforçarem o perímetro da Escola... Eram anos difíceis, com a ameaça comunista e o terrorismo ainda latente e era nosso dever como militares ativos (ou seja, "bicharal ainda fresquinhos", apesar de alguns já passarem dos 30, caso do nosso Oliveira, o "14 Bis" que, promovido a 2S, foi pego pela "expulsoria" meses depois, chegando a 1S na RR somente)ajudar a proteger o quartel. O perímetro foi dividiu em diversas "trincheiras", cada uma comandada por um 4a Série prestes a formar, com uma guarnição de 6 alunos. A minha "trincheira", ficava a uns 300 metros da "Pinguela", onde também tinha outro posto de guarda. No terceiro dia de serviço, estávamos eu e o "Moraes Patada" (como se vê, nobre representante dos Pampas) tirando o quarto de 02 às 04, quando lá pelas 3:00 houve uns berros lá pras bandas da Pinguela; o sentinela de lá, berrava a plenos pulmões o clássico "ALTO, QUEM VEM LÁ?!"; Após uma pausa, novamente: - "ALTO, SENÃO ATIRO". Nessas alturas, eu e o Moraes colocamos bala na agulha dos mosquetes e ficamos prescrutando a escuridão prós lados da Pinguela, tentando ver alguma coisa. Após mais alguns momentos, ouviram-se 4 disparos pelo que, supunha-se que aquele posto estava sendo atacado. Minutos depois, começou um movimento dos diabos, com viaturas passando por nós, conduzindo Soldados e Alunos, uma confusão daquelas! Uma meia hora depois, os carros começaram a retornas e, paramos uma Kombi, cheia de PAs para perguntar o que houve!? A resposta foi a mais inesperada possível: - " os caras do posto da Pinguela, mataram um burro lá no meio do mato"... Aí a turma caiu na gargalhada, que logo cessaram, quando o 4a Série que nos comandava falou: - "isso vai dar merda..." Aí, ficamos pensando o que aconteceu e aconteceria. No dia seguinte, soubemos como foi: - os caras da Pinguela, ouviram um barulho no matagal e aí começaram a gritar as ordens; como ninguém respondeu e o barulho vinha em direção deles, abriram fogo! Era simplesmente o burro que pertencia ao Carroceiro que vendia verduras na Escola e que, fugindo, resolveu pastar junto à cerca de arame farpado que rodeava a Escola, justamente próximo à Pinguela. O Carroceiro foi na Escola e criou o maior caso, pois queria que pagassem pelo animal morto, o que foi feito. Devido a situação de atenção e meia-prontid na Escola, o Briga Lacerda resolveu não punir ninguém; apenas o Comandante do CA, Major Carmona, o "Estopardine", reuniu o "bicharal" e deu uma solene "mijada" na turma e ficou por isso mesmo. Não sei se em turmas anteriores à minha aconteceram casos semelhantes mas, pelo visto, nas posteriores sim mas, menos trágica (pelo menos para o burro)a não ser, talvez, a levada das calças, no dia seguinte, para as lavadeiras limparem... Valeu Baracho, pela iniciativa!